Adoção informal pode caracterizar crime
O pescador J. L., 37 anos, e sua mulher, a marisqueira S. T., 32 anos, acordaram em uma manhã de domingo com um bebê no batente de casa. A criança era filha de uma vizinha do povoado onde moram, na Ilha de Itaparica.
Dependente química, a mãe da criança abandonou a filha recém-nascida na porta do casal e, em seguida, desapareceu.
Desde então, a pequena Gabriela, hoje com 1 ano de idade, passou a viver com J. L. e S. T. “A gente não queria filho, mas não tinha como abandonar a criança. Aí pegamos ela para criar”, conta a marisqueira, sem se dar conta de que o que fizeram – adotar a criança informalmente – é arriscado e, em alguns casos, é considerado crime.
De acordo com o juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, Gabriel da Silveira Matos, há diferentes tipos de adoção irregular.
No Brasil, entre as mais comuns está a chamada intuitu personae, que não é classificada como crime, mas sim como uma adoção irregular.
Neste caso, o casal/pessoa aproxima-se de uma criança por diversas razões – por exemplo, a encontra abandonada ou a recebe da mãe biológica – e fica informalmente com ela por um determinado período.
Em seguida, dirige-se ao Judiciário pedindo a sua “guarda provisória” e, depois, a adoção.
“Este é um procedimento irregular no qual o pretendente não é previamente inscrito no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), nem usou o cadastro para encontrar a criança. A pretensão de adoção, neste caso, é arriscada porque pode ser revertida”, explicou o juiz.
Há também um outro tipo de adoção irregular, conhecida como adoção “à brasileira”. Ocorre quando o pretendente encontra uma criança, informalmente, e a registra diretamente no Cartório de Registro Civil, como se fosse filha biológica, fugindo das exigências legais pertinentes ao procedimento da adoção.
“Hoje, este tipo de adoção é menos frequente no país. Isso porque, para registrar um filho no cartório, é exigida uma Declaração de Nascido Vivo, que é um documento público numerado e preenchido pelo médico no hospital, que atesta que determinada criança nasceu de determinada mãe”, diz o juiz.
Sanções penais
É o chamado crime contra o estado de filiação, trazido pelo artigo 242 do Código Penal: “Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil”. A pena para quem praticar este tipo de crime é de dois a seis anos de reclusão.
Além de sujeitar o adotante a essas sanções penais, a adoção informal pode dar margem à suspeita de outros crimes, a exemplo do tráfico de crianças.
Foi o caso de Maria Cristina de Jesus Santos, presa no dia 20 de junho, em uma abordagem realizada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) na BR-324, altura de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador.
A suspeita estava com um menino de quatro meses e não possuía documentos que provassem a responsabilidade sobre a criança.
Além dela e do bebê, estavam no carro um argentino e uma mulher. Ela foi abordada por conta de uma denúncia anônima que falava sobre sua atividade ilegal e dava a descrição do veículo em que ela estaria, um Sandero da marca Renault.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Polícia Federal informou que Maria Cristina declarou que havia recebido o menino de uma mulher na cidade de Serrinha, quando o mesmo tinha três dias de nascido, mas que ainda não havia formalizado a adoção.
Segundo a mulher, o homem que dirigia o carro era um ex-namorado, e a mulher, uma amiga. Ainda de acordo com a versão de Maria Cristina, todos estavam vindo de Feira de Santana para Salvador a passeio.
Maria Cristina e todos os envolvidos foram ouvidos e liberados no mesmo dia. “Não houve nada que indicasse que se tratava de um caso de tráfico de crianças”, informou a assessoria da PF.
Ela vai responder por infração administrativa – conforme artigo 251 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – por transportar criança sem autorização judicial e sem documentação que comprovasse o parentesco. A pena é multa de três a vinte salários mínimos.
Passo a passo para a adoção legal
Procure uma vara da infância
A Vara da Infância e Juventude é o primeiro local que os interessados em adotar uma criança devem procurar para iniciar o processo. Dirija-se à mais próxima do seu município e fale sobre o seu interesse
Idade
A idade mínima para se habilitar à adoção é 18 anos, independentemente do estado civil, desde que seja respeitada a diferença de 16 anos entre quem deseja adotar e a criança a ser acolhida
Cadastro
Os pais ou família interessados na adoção irão preencher um cadastro e apresentar documentos. Será preciso fazer uma petição – preparada por um defensor público ou advogado particular – para dar início ao processo de inscrição para adoção (no cartório da Vara de Infância). Só depois de aprovado, seu nome será habilitado a constar dos cadastros local e nacional de pretendentes à adoção
Curso e avaliação
O curso de preparação psicossocial e jurídica para adoção é obrigatório. Após comprovada a participação no curso, o candidato é submetido à avaliação psicossocial com entrevistas e visita domiciliar feitas pela equipe técnica interprofissional. Algumas comarcas avaliam a situação socioeconômica e psicoemocional dos futuros pais adotivos apenas com as entrevistas e visitas. O resultado dessa avaliação será encaminhado ao Ministério Público e ao juiz da Vara de Infância
Certificado de Habilitação
A partir do laudo da equipe técnica da Vara e do parecer emitido pelo Ministério Público, o juiz dará sua sentença. Com seu pedido acolhido, seu nome será inserido nos cadastros, válidos por dois anos em território nacional
Fonte e Foto: Jornal A Tarde / Cadastro Nacional de Adoção. Informações: www.cnj.jus.br